Benfica: pois é, agarrar o topo… por Santos Neves
MAL assinou contrato com o Benfica, Jorge Jesus foi categórico: com ele, a equipa iria jogar o dobro do que jogara na época anterior. Escrevi que isso nada teria de difícil; o dobro de nada, nada é; e o dobro de muito pouco não pode ser grande coisa… Na verdade, esse Benfica de Jesus jogou muitíssimo mais do que jogara o Benfica de Quique Flores, chegou a ser fulgurante e sagrou-se campeão nacional.
Agora é tempo de Jorge Jesus reconhecer que o actual Benfica não joga nem metade do que jogava o Benfica de há um ano. Perdeu imenso em qualidade, em ritmo competitivo, em talento e eficácia, em capacidade atlética e anímica, em empolgamento. Isto dentro de campo. Fora dele, estupefacto e desorientado com as suas derrapagens, vai dando tiros nos pés. Em minha opinião, as reacções públicas da administração e do treinador têm sido festival de erros. Amiúde roçando o caricato.
Tudo começou naquele comunicado em que, a propósito dos (evidentes) erros de arbitragem em Guimarães, o Benfica quis arrasar este mundo e o outro; o comando da arbitragem, mas também o secretário de Estado, a Olivedesportos, a direcção da Liga (ameaça, ridícula, porque de impossível concretização, de não disputar a Taça da Liga!) e todos os clubes, mediante apelo aos adeptos para não se deslocarem a jogos fora da Luz. Em rajadas de metralhadora, foi tudo a eito! Só que em ninguém acertando… - e com ricochetes para dentro do Benfica. Então escrevi que o Benfica, à 4.ª jornada, acabava de mostrar desistência de ser bicampeão. Cabeça perdida à 3.ª derrota no campeonato. E não venham dizer que a anterior, em casa do Nacional, também foi por causa do árbitro…
A este destempero não escapa Jorge Jesus. Enfiada de afirmações supostamente galvanizadoras ficam ridicularizadas no jogo seguinte (vide derrotas na Alemanha e em França). Jorge Jesus insiste em recusar o óbvio: o que galvanizava há um ano tinha forte base de sustentação; desfeita esta, eis o vazio do blá-blá-blá.
O actual Benfica não pára, não escuta e não olha… para dentro de si próprio. Este é o caminho para o desastre até parecendo suicídio.
Disse Luís Filipe Vieira que a maior importância do título era não ser avulso, sim o início de nova era. Deveria ter acrescentado: o mais difícil não é chegar ao topo, é lá ficar. E logo surgiu o primeiro erro: presidente e treinador, em entusiástico uníssono, garantiram que o Benfica desta temporada iria ser ainda mais forte e até ao assalto da Champions. Não gosto de ser desmancha-prazeres, mas logo escrevi que um Benfica sem o inigualável Di María da época passada não poderia ser mais forte, e, quase de certeza, seria mais fraco. Frisando: quiçá perda ainda mais importante do que a do FC Porto na tão sentida saída de Lucho…
O actual grande problema do Benfica começou nisto: preparou-se mal para substituições de Di María e Ramires (e, creio, também para alternativas a Cardozo, Aimar, Saviola…). Por arrogância, ou por incapacidades técnico-financeira (após mais de cem milhões investidos no futebol na era Vieira). Evidência mor: o Benfica deixou de ter flanqueadores (Salvio terá capacidade para se impor na direita?; na esquerda, Gaitán, sem dúvida bom jogador, com larga margem de progressão, não é dali…). Mantendo-se modelo de jogo e esquema táctico, a bola passou a pouco e mal chegar ao ponta-de-lança muito fixo, quase tipo poste, seja ele Cardozo ou Kardec. Por isso a equipa melhora quando Coentrão avança para extremo. Com este alto risco: não se consolidar grande extremo e perde-se grande defesa-esquerdo.
Quiça antes de tudo isto: os altos comandos na Luz não terão assimilado, em devido tempo, que o FC Porto iria reagir em força. Tal como, há um ano, o FC Porto foi surpreendido por novo Benfica… A grande diferença para esta temporada viu-se logo na final da Supertaça. Posições invertidas. Na embalagem de empolgamento e na estupefacção de marcha-atrás.
Fonte: A Bola